Semana passada a revista Veja se superou com a matéria sobre a "quase" primeira-dama, Marcela Temer. Com uma pegada muito mais Caras do que Veja, a revista tentou vender "inocentemente" a imagem imaculada de família feliz do pmdbista. Exemplo a ser seguido. Afinal, Temer tem sorte.
Essa revista é um perigo para qualquer incauto. Cria verdades quando a realidade não convém. E qualquer analista de discurso pode encher linhas e linhas de tese sobre sua imprensa pouco preocupada com os fatos e suas afirmações tendenciosas. A revista Veja há tempos não vale a pena. Talvez nunca tenha valido. Provavelmente não.
Mas, nós vivemos em um país de analfabetos funcionais, um país que cita a revista Superinteressante como revista científica. E isso vem de um grupo escolarizado e informado a ponto de comprar/assinar revistas, portanto, nesse perfil, Veja é informação. O que me leva a pensar que a escola precisa mudar: URGENTEMENTE! Pois escola cara não necessariamente quer dizer escola boa. Enquanto a escola servir o interesse do mercado, é isso que teremos. Gente que passa anos nos bancos escolares, que compra um papel, mas pensar que é bom... Alunos ainda. Do latim: seres sem luz.
E são esses seres que não veem problema algum nessa matéria. Afinal, as feministas defendem as mulheres. Deveriam defender todas as mulheres. Inclusive as que escolhem ser do lar. Para você que pensa assim, vamos elucidar alguns pontos sobre a análise do discurso em questão. Percebendo não apenas o que está escrito, mas o que fica subtendido. E, principalmente, o que é negligenciado nessa matéria.
Antes de qualquer coisa, quero que Marcela Temer seja muito feliz com seu velhinho. O amor é mesmo uma flor roxa. Quem pode julgar uma miss de vinte anos que se apaixona por um político de 62 anos? Às vezes, o sentimento vem bem físico, às vezes, é uma coisa de interesses em comum. Certamente, a beleza de Marcela foi algo menor diante da conexão das almas, até a mãe dela percebeu que se amavam muito. E fica bem claro que, tornando-se primeira-dama, desempenhará o papel como lhe cabe e como a revista prevê: bela e recatada. Já que talvez possa parecer escandaloso para algum olhar uma mulher tão jovem com um homem mais velho. Ela corre risco ao usar batom vermelho, por exemplo. Tanto por ser associado a todo mal do mundo (PT), quanto por correr o risco de ser mais Evita do que Grace Kelly.
Como disseram na internet, queria só ver se fosse a Dilma com um cara, não 43 anos mais jovem, bastava dez, bonito não como Marcela, como uma pessoa comum deve ser, o que será que essa revista escreveria? Provavelmente, teceria elogios sem fim. Afinal, o machismo não existe. E as feministas reclamam de tudo. Acho que é falta de rola.
Mas a Dilma não é bonita. É feia. E a beleza, em uma mulher, é condição sine qua non para exercer qualquer função, inclusive governar um país. Não, espera, mulheres têm TPM, isso imediatamente as desqualifica para quaisquer funções administrativas. Pois elas podem ter crises de nervos!
Ironias a parte. Acho que Marcela faz muito bem. Por amor, por interesse, por conveniência... Não interessa. Marcela, seja feliz! Pague suas contas. Compre seus vestidos. Vá no seu cabeleireiro famoso. E no seu dermatologista das estrelas. Bela, definitivamente, você já é. Recatada: problema seu e da posição que assumiu. Agora, do lar...
A revista faz uma diferença interessante. Marcela não trabalha. Marcela é do lar. Essa parte me ofendeu. Talvez a parte que mais tenha ofendido. Marcela não lava roupa. Marcela não limpa o chão. Marcela não passa, não tira pó, não faz comida. Pelo que entendi da matéria, Marcela monitora o facebook. Marcela, gente, é dona da casa, pode até ser uma pessoa caseira, sei lá, mas Do Lar, ela não é não. Em consideração a todas as pessoas (não só mulheres) que assumiram essa função de tempo integral, sem folga, férias, licença ou qualquer outro benefício, não posso admitir que Marcela seja do lar. Porque Marcela tem a parte, digamos, glamourosa do cuidado do lar, como comprar um vaso de cristal que orne bem a sala de jantar, mas, definitivamente, Marcela nem deve se lembrar de como se lava um banheiro.
O problema maior, entretanto, está em vender Marcela como um exemplo. Afinal, Temer tem sorte. O homem que pode ter uma mulher bonita, recatada e do lar. O homem que tem uma ninfeta na cama, que o incendeia como ele diz em seus versos, mas que na rua exerce o papel que se espera dela, a ponto de não feri-lo enquanto homem sério, incapaz do dito ataque de nervos típico das pessoas que sofrem com a TPM.
Existem mulheres de todos os formatos e cores. Nem todas serão belas, magras, brancas e loiras como Marcela, nossa quase miss. Existem mulheres temperamentais, mulheres afetadas, sexualizadas, escandalosas. Existem advogadas, médicas, pedreiras, caminhoneiras, prostitutas e professoras. Mulheres caseiras, evangélicas, donas de casa. Musas fitness que não sabem nem como se cozinha um ovo. Mulheres que não nasceram mulheres biologicamente. Mulheres que amam outras mulheres. E é sempre uma sorte encontrar com elas. Inclusive com uma Marcela. Por isso mesmo, Marcela não é prototípica, Marcela, no seu perfil homogêneo, não nos representa. Pois ela é exatamente tudo que esperam que a gente seja e exatamente tudo que a gente não faz mais questão de ser.
Nosso sonho não é ter mais um filho com o Mi. Embora algumas de nós sonhem em ter mais filhos. Nosso sonho é um país onde uma mulher feia, mesmo sendo feia, pode terminar o mandato para o qual ela foi eleita pela maioria. Porque isso sim é democracia. E porque isso sim representa a metade dos eleitores desse país, mesmo com um legislativo tão incipiente de figuras femininas. Porque isso sim é exemplo do que uma mulher pode desejar ser...
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