─ Alô? – Acordou sobressaltado,
procurando o telefone que caiu. Pensou mil coisas. Que alguma coisa aconteceu.
Com a mãe. Com a irmã. Que horas eram? 2:15 da madrugada.
─ ... – O silêncio do outro lado o
estava deixando louco.
─ Alô? – Perguntou novamente. Procurava
pelo número no visor, mas não fazia ideia de quem poderia ser. – Olha, se for
trote... – Começou a se zangar.
─ Sou eu. – Sentiu as forças se
esvaindo. Reconheceria aquela voz até no inferno. Era com ela que conversava
nos seus sonhos. Vinícios deixou seu corpo pesar e caiu na cama.
─ Malu...
─ Eu precisava ouvir a sua voz.
Ela estava chorando. Dava para sentir
pela respiração falha. Tentava dar alguma firmeza àquela fala, mas não
conseguia. O coração de Vini acelerou. Ela. Bastava ela. A voz dela. A
respiração dela.
O silêncio que partilhavam naquela
ligação dizia tantas coisas. As lágrimas que ele sabia que corriam nos olhos
dela, também desciam uma a uma devagar pelos seus. Passara meses para se
reerguer, mas o som da voz dela era o suficiente para deixar claro que ele
nunca superaria.
─ Está tudo bem com você? – Criou forças
para perguntar. – Aconteceu alguma coisa?
─ Aconteceu. – Não tentava mais esconder
que estava chorando.
─ Está tudo bem? – Preocupou-se.
─ Aconteceu que eu não tenho você. – Ela
soluçava. E as lágrimas também caíam sem controle dos olhos dele.
─ Ah Malu! – Respirou fundo. – Não faz
assim, vai... – Quase implorou. – Você escolheu. Eu também decidi. A gente não
pode ficar nessa tortura, sabendo que é o certo e desejando que fosse
diferente. Não chora, por favor...
─ Eu sei de tudo isso, Vini. Mas...
─ Mas...
─ Sem você não tem graça.
─ Eu sei que você está namorando.
─ Eu sei que você está beijando milhares
de bocas também...
─ Trocar acusações vai resolver alguma
coisa?
─ Ficar me procurando nos braços das
outras por um acaso vai? – Vini se surpreendeu com a resposta. Era uma voz
firme. Decidida. Nem parecia a Maria Lúcia. Ficou em silêncio. Não tinha mais o
que dizer. Não naquela situação. Ficou ouvindo a respiração apressada dela do
outro lado da linha. – Para mim não está adiantando nada. – Ela continuou a
falar de repente. – Bastou ver uma foto sua com a Ana Maria no boliche nas
redes sociais e nada do que estou fazendo aqui fez mais sentido. – Malu tornou
a chorar com mais intensidade.
─ Malu, o que você fez? O que aconteceu?
─ ... – Ela não respondeu. Vini entendeu
tudo.
─ Você transou com seu namorado? –
Precisou de todo o autocontrole que tinha para conseguir pronunciar essa frase.
A resposta foi pouco mais do que um
grunhido de concordância. Vinícios sentiu o planeta girar, o chão sumir. Ainda
bem que estava deitado ou então, certamente, desfaleceria. No íntimo, sabia que
cedo ou tarde aquilo aconteceria, mas nunca imaginou ter de discutir isso com
ela.
─ Ele te machucou? Você está bem? – Era
tolo a esse ponto. Encontrava forças para se preocupar com ela. Mesmo estando
destruído por dentro.
─ Não. Foi bom. – Ela fungou. Vini
tentava lidar com a palavra bom. Era como ser eletrocutado aos poucos. – Só não
foi você...
─ Malu...
─ Sei que estou sendo cruel. Ligando
para você uma hora dessas. Reclamando de uma foto. Como se eu tivesse direitos
sobre você. Mesmo tendo namorado. – Vini ainda não se recuperara da notícia.
Cenas do amor de sua vida na cama com outro homem ainda não tinham saído de sua
cabeça. Misturavam-se com cenas deles dois. E doía. Tanto a lembrança, quanto a
constatação do fato de que não estavam mais juntos. – Eu só queria que você
soubesse que parece que eu superei você, mas não é verdade. Penso em você a
todo o momento. Em cada, música que toca, em cada floco de neve que cai...
─ Em cada beijo, em cada toque do seu
namorado? – Não a deixou concluir o raciocínio.
─ Isso te machuca? – Perguntou
interessada. – Se machucar, acabo com tudo isso agora mesmo...
─ Não faça isso. – Decidiu. – Por mais
que eu não possa fingir, não para você, o quanto o fato de você ter transado
com outro cara me afeta. E como afeta. – Respirou fundo. – Tenho que admitir
que você esteja certa. Está tentando reconstruir sua vida. Tentando ser
feliz...
─ Não estou conseguindo, se quer
saber...
─ Mas vai... – Vini assumiu um tom de
voz carinhoso. – Vai sim. E eu também vou.
Os dois partilharam novamente o
silêncio. Representação física do vazio que agora havia entre os dois.
─ Malu, eu amo você.
─ Também amo você. Muito.
─ Preciso de um favor seu...
─ Qualquer coisa.
─ Não me liga mais. – Sentia seu coração
dar um salto, contorcer-se de dor dentro do peito. Mas era algo que precisava
ser feito.
─ Vini... – Ela implorava.
─ Vai ser melhor assim. – Estava
decidido. – Para nós dois.
─ Vini...
─ Eu não quero ser uma âncora que te
prende ao passado. Tudo que deveria ter sido e não foi. – Soluçou. – Nem posso
permitir que o que eu sinto por você se torne uma prisão, um motivo para remoer
cada palavra trocada ao telefone, cada foto postada na internet, cada notícia
trazida por um amigo, cada verdade que construirmos nas nossas novas vidas. Eu
preciso deixar você ir. Eu preciso deixar de me importar. Você entende?
─ ... – Silêncio. O que ela poderia
responder?
─ Malu, espero que você entenda que isso
não tem nada a ver com o que você me disse hoje. O sentimento que carrego em
mim é maior do que qualquer coisa que você possa fazer. Mas, estou percebendo
que isso, talvez, não seja legal. – Forçou um sorriso. – Que eu tenho que
deixar sobressair um pouco mais de mim. Que eu preciso aprender a me bastar. –
Enquanto falava, convencia mais a si mesmo do que a ela. – Por isso, vou
repetir o pedido: não me liga mais. Por favor, não me dá mais notícia...
─ Eu nunca vou te esquecer.
─ Já eu, vou tentar te esquecer com
todas as forças. Mas não é porque eu não te ame, é porque eu te amo demais. E
isso está me machucando muito.
─ Queria que fosse diferente...
─ Isso é possível? – Ambos buscavam, no
plano das possibilidades, um universo alternativo em que a relação deles
pudesse acontecer.
─ Creio que não. – Malu se lembrou de
todas as conversas antes da viagem. De tudo que tentaram. Da força necessária
para se conformar com o destino. Da aceitação. Da lealdade. Do fim.
─ Você me entende? – Ela poderia
facilmente ouvir o quanto aquela ligação mexera com ele. Estava ofegante. Vini
não parava de fungar. Pensou que ele iria se magoar com a história do sexo. O
coração de Vini era repleto de amor. Tinha impressão de que nada abalaria
aquele sentimento louco que aprendera a amar também. Ao mesmo tempo, dava-se
conta que aquilo não estava fazendo bem a nenhum dos dois. Estava apenas os
impedindo de continuar. Ambos precisavam seguir em frente. Arrancar de vez o
band-aid de uma ferida que não cicatrizava e deixá-la exposta. Talvez, assim,
alguém conseguisse entrar para curar ou transformar o sentimento em outra
coisa. O que Vini pedia era justo.
─ Entendo.
***
Na opção de marcar a sua reação com o post deveria ter "acabou com as minhas estruturas"
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