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sábado, 13 de abril de 2013

Vida de professor de Literatura não é fácil!


Hoje vamos de desabafo...
Garanto que não vai ser o tradicional desabafo do salário. Isso não tem a menor graça. Professor é uma espécie desvalorizada, maltratada pela sociedade e, por isso mesmo, em extinção. Enquanto for assim, esse país não se levantará do berço esplêndido. Mas já nem sei se há interesse nesse despertar...

Quero falar de algo mais específico. Quero falar de ser professor de literatura. Literatura: esse negócio que não serve para nada. Por mais que as mentes práticas consigam dar um sentido para se estudar Literatura, passar no vestibular, conhecer o país, a vertente histórica da literatura... Garanto, é perda de tempo, a bichinha não serve para nada. Você conseguiria qualquer uma dessas coisas de outas maneiras também.

Em verdade, a pergunta a ser feita é: a gente só precisa do que serve para alguma coisa?
Na minha cabeça, muita coisa que não tem um propósito pode ter seu valor. Amor de avó, por exemplo, uma criança não precisa de uma avó para ser educada, mas a presença dela tem um valor inestimável. Eu que o diga.

Acho que dar um propósito a Literatura tira o que ela tem de melhor: o prazer. Para mim, Literatura é escolha, é construção, é compreender-se através de um outro. O instante que antecede a escolha de um livro é um momento mágico. É estar diante do infinito. Sabe-se lá para onde aquelas palavras podem te levar? Estudar literatura para alguma coisa é cortar as asas de alguém que pode muito bem voar sozinho por esse universo de possibilidades que é ler.

Por outro lado, ninguém aprende a voar sozinho. É um negócio que exige observação e técnica. Então, ser professor de Literatura talvez seja ser como um instrutor de voo. Melhor seria que o primeiro instrutor então  fosse o pai ou a mãe do aprendiz como acontece na natureza. O professor de literatura seria um instrutor para novos lugares, para terrenos mais inóspitos, para outras condições mais complexas de voo. Só que não. Acaba que fica com a gente até as primeiras batidas de asa.

E como é difícil fazer isso! Como trazer o prazer para a sala de aula? E mais, fazer o aluno compreender que a Literatura vai além do prazer... Que literatura, como toda arte, pode sim estar além da compreensão, além da concordância, além do que você consegue perceber?

Não sei não. Às vezes bate uma tristeza! O Ensino Médio quer leitores críticos. Como se nós não temos leitores?

Nesse universo, confesso, cada dia mais abro mão da teoria literária. De que adianta comparar o Barroco à Legião Urbana? O menino simplesmente não tem bagagem para compreender o que é uma característica do período. É um exercício de generalização que vai além da experiência dele. No mais, é cópia, é reprodução do que está no quadro, sem nenhuma racionalização. 

Não estou falando de todos, é claro. Só de noventa por cento de uma turma.

Esses dez por cento que escapam, que já vêm de casa lendo. Esses não dão o menor problema. Vão aproveitar a Literatura no que ela tem de melhor a oferecer, vão abrir portas e conhecer o mundo. Mas, e o restante?

Será que é válido ficar batendo nessa tecla das características e fazer o menino sair da escola sem uma única experiência prazerosa com a leitura? Será que é O menino de Engenho que vai proporcionar essa experiência?

Acho que não.

Nesse semestre, mais uma vez, estou tentado fazer ler. Ensinar a voar.

Agora, quanto mais penso, acho que eu também tenho que aprender a sair do chão. No caso, tô mandando o currículo regular do Ensino Médio para as cucuias. Vou dar minha aula tradicional também, é claro. Mas vou voar com meus alunos pelas listas de livros próprias para os jovens adultos. Vou convidá-los a conhecer Nárnia, a entrar com Mariah Mundi dentro do Príncipe Regente, a visitar o Reino das Águas Claras... E se eles quiserem vir comigo, a gente vai, sem ligar que o primeiro ano é do Barroco e do Arcadismo.

Vou contar também com uma ajudinha das mídias digitais. Pretendo fazer com eles um vlog de literatura. Só literatura de fantasia. Eles lendo livros e indicando livros. 

Quero o encantamento. Quero a surpresa. Quero a sensação de sair do chão pela primeira vez.

Eu me pergunto: será que vai dar certo? Ou será só mais um devaneio louco de alguém que escolheu uma coisa que não serve para nada como profissão?

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