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terça-feira, 15 de março de 2016

Pragmatismo político

Eu realmente queria não falar sobre o assunto. Queria conseguir passar a semana trocando ideias com vocês sobre tinta guache e ovos de chocolate, mas não dá. A mente fervilha, os dedos tremem e o teclado pede para ser golpeado.

Como professora, furto-me várias vezes da oportunidade que me é oferecida de discutir temas polêmicos sob um viés de formadora de opinião. Apesar da minha disciplina permitir um diálogo com certos temas, tento me eximir de tratar de política e religião (e futebol) quando não é extremamente necessário. Principalmente para dizer o que é certo e o que é errado. Afinal, faz parte do meu trabalho ensinar a esses meninos a entender os textos e o discurso em que estão inseridos e a escolher sozinhos.

Entretanto, sobre as manifestações de domingo, um fato precisa ficar claro: o papel exercido pela mídia. Numa terra de analfabetos funcionais como a que vivemos, em que as pessoas veem filmes porque não conseguem ler os livros (falamos aqui de Harry Potter, não de 1984), um lugar onde pouquíssima gente compreende um extrato de cartão de crédito e que as pessoas passam informações nas redes sociais sem sequer verificar sua veracidade, o que se pode esperar dos meios de comunicação?

Eis um tema bacana para redação. Mídia e verdade. Existe isenção de opinião no texto jornalístico? Os livros didáticos falam de um texto de sequência narrativa e descritiva, mas não será esse um belo disfarce para o perfil ideológico necessário para as revoluções?

Recomendo muitíssima parcimônia nesse momento. Pois o agora pede reflexão e leitura, não euforia. Uma imprensa que ousa comparar as manifestações do dia treze com as Diretas Já sabe que não tem nada a perder (não acredita, veja aqui). Usa sem a menor vergonha na cara a falta de memória dos brasileiros. A mencionada falta de aulas de História. 

As pessoas morreram, desapareceram, foram torturadas em prol do fim da ditadura, chega a ser patético sequer mencionar o movimento deles numa comparação com uma manifestação em que algumas pessoas pediam a volta desse sistema de governo. Manifestação pacífica em que os populares tiravam selfies com a polícia, o que por si só já é um absurdo (poderia escrever um texto só sobre isso).

Mas compararam somente o número de manifestantes. Será a tese dos que acreditam na isenção do texto jornalístico. Além de ser incoerente estatisticamente, visto que estamos diante de números bem diferentes se tomarmos como referencial a população, analisar esse discurso como isento é ignorar o fato de que existe aí sim uma necessidade de pintar de verde-amarelo o coração ufanista da "geração Coca-cola" apresentada por Renato Russo.

E "que país é esse?" diria ele.  É um país que vai às ruas contra a corrupção na política, por causa da crise econômica, pedindo o impeachment de um representante recém-eleito pela maioria. Respeito demais o direito a se manifestar. E, infelizmente, não posso argumentar que nas ruas estavam apenas representantes da elite, seja lá o que isso signifique no Brasil. Tampouco posso dizer que, se houver uma próxima, o número de pessoas envolvidas diminuirá. 

A tendência é que o número aumente cada vez mais com pessoas muito bem-intencionadas. Mas, de boas intenções o inferno está cheio.

Estou com a Pitty, apesar de não ser uma fã de seus estilo musical. Marchar de braço dado com a polícia, ao lado de fanáticos religiosos, contra um estado democrático de direito, propagando um discurso de ódio, não faz a minha cabeça (e não estou falando dos nomes dos políticos que convocaram essas manifestações, estou falando dos populares mesmo). E isso vai muito além de PT e PSDB. Não vou e pronto.

Para além disso, gostaria de comentar alguns pontos na relação mídia x manifestação. Cadê a crise econômica mundial? 

“Nós não temos uma notícia sobre o perigo da instabilidade econômica mundial, da situação da Europa, da situação dos EUA, da China, e o significa o Brasil ali. Então, a crise brasileira é vista isoladamente, ela não tem contexto”, comentou a filósofa Viviane Mosé no Observatório da Imprensa. 

Esse trecho está aí no vídeo. Assista. Apesar de que toda pessoa formada em filosofia é formada também em PT (isso é uma ironia).

Mas como discutir economia mundial com quem não faz ideia de como o dólar influencia a vida prática? Para quem não compreende o que significa pagamento mínimo no cartão de crédito?

Só me diz, como é que o José Sarney continuou no senado? Afinal, a marcha não é contra tudo e contra todos (Não vamos nem falar de Aécio). Há um tempo atrás, tinha prova, tinha testemunho, tinha tudo contra este homem, mas agora ninguém fala mais nada. Nem sequer rodinha de rodapé. Ele deve ser inocente já que não se conseguiu provar nada (outra ironia). Trecho do discurso de Sarney, quando ele desistiu do cargo de senador em dezembro de 2014: “Deus me poupou do sentimento do ódio e do ressentimento, da inveja e do desejo de vingança”. Veja que linda despedida aqui.

Sarney não precisou convocar ninguém para manifestação nenhuma. Sentado no trono, tendo a família como corte. Ele espera o bicho que vai dar, totalmente ciente de que é dono da banquinha.

Mas como discutir corrupção com quem acha que o Brasil é igual a Governo Federal? Uma relação de um para um. Ou seja, a culpa é do presidente. Com quem vai às ruas pedir impeachment e vota no vereador porque ele é seu conhecido. Porque ele prometeu o cargo comissionado para o sobrinho ou o asfalto na rua detrás da sua casa.

Como discutir política com quem não faz ideia do que significam os três poderes? Com quem não sabe que esfera do governo gasta o dinheiro do imposto que tanto se reclama de pagar? Com quem vê o mesmo programa governamental na Suécia como prova de civilidade e no Brasil como assistencialismo?

Estou com a Viviane Mosé quando ela afirma que a mídia colabora nessa alimentação de um discurso raso que não avalia prós e contras e não abre as portas de um diálogo entre população e governo ELEITO. Selecionando a informação relevante na construção de um ideológico que lhe seja pertinente, escondida por uma suposta isenção do gênero jornalístico, a mídia faz o que quer em um país de analfabetos funcionais.

Portanto, resta-me discutir democracia que me parece a lição mais fácil de entender. O seu direito vai até onde esbarra no meu. E nós temos direito de debater esses limites através de um diálogo (saudável). Contanto que estejamos cobertos pelo manto de uma constituição que nós entende como iguais. 

Dessa forma, estou dizendo que:

Sou contra atropelar a legislação e o processo investigativo em favor de euforia popular. 

Sou contra a adoração de ídolos que surgem no furor de uma crise (com Hitler foi assim). A essas pessoas são atribuídos poderes que não lhes cabem. 

Sou contra uma marcha contra tudo de ruim, pois, na verdade, essa marcha vai ser usada para validar aquilo que for conveniente para as pessoas com poder o suficiente  para usá-la em seu benefício.

Sou a favor do seu direito de protestar, mas eu mesmo não me presto ao papel de levantar um cartaz em prol da ditadura. Nem me presto ao papel de marchar ao lado de uma pessoa que o faça (questão de princípios).

Não é só Brasil, olha um Kuczynski com a mesma ideia.
Mas os tons a imagem são de vermelho, então não presta.
Sou contra derrubar um governo eleito pela maioria, principalmente, num contexto midiático desses.

Sou contra uma ideologia que mostra uma política maniqueísta de bem versus mal, quando na verdade estamos diante de um mosaico de nuances de interesse. Que passam inclusive pelos nossos próprios interesses (lembre-se do vereador que vai asfaltar a rua de trás).

Vai ver que é por isso que eu posso ser taxada de tudo que não presta: petista, comunista, feminista... (E sim: isso é uma ironia).

Mas talvez eu seja apenas uma cidadã educada para pensar além do que se vê. 

Plim plim!






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